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Publicação póstuma traz conto premiado na década de 90 em Paris

23-set

Vacilante, tímido, o menino me estende uma cartolina creme dizendo: não sei se saiu bom, sou estudante de Artes Gráficas, o que a senhora acha? Olho para o papel e me espanto, que coisa genial! Tão inesperada como tudo o que aconteceu durante nossa convivência forçada. Ele desenhou um enorme buquê, preso por duas mãos entrelaçadas, os dedos em forma de fitas coloridas. Só que, em lugar de flores, viam-se línguas de todos os tamanhos e formatos, dispostas de tal maneira, que pareciam estar se movimentando. Olhei para ele, disse, que maravilha! É para a senhora. E saiu correndo, nem tive tempo de agradecer. Fui para o escritório, coloquei na jarra de porcelana chinesa, bem no centro da mesa, o meu buquê de línguas. Vivas.

Este é um trecho do livro “Buquê de Línguas”, de Tereza Albues. A obra é uma publicação póstuma com quatorze contos distintos, sobre diferentes povos, lugares e costumes. Lançado em 2008 pela Carlini e Canaito Editorial, o carro-chefe das narrativas é conto que dá nome à obra, premiado com Menção Honrosa no Concurso de Contos Guimarães Rosa, em Paris, 1999.

Tereza Albues faleceu em 2005, deixando uma herança incomensurável de obras publicadas e tantas outras inéditas, a exemplo desta edição.

Onde comprar

Você pode adquirir “Buquê de Línguas” no site da Carlini e Caniato Editorial. Clique AQUI para acessar.

Resenha

Leia abaixo uma resenha sobre “Buquê de Línguas”, intitulada “Tereza Albues: a apaixonada cosmovisão”, escrita pela poetisa Lucinda Persona:

Na primavera de 1999, em New York, Tereza Albues concluiu seu conto Buquê de Línguas e nesse mesmo ano esteve em Paris, para receber menção honrosa ao referido conto no Prêmio Guimarães Rosa, promovido pela Radio France International.

Esses fatos, ao integrarem a realidade fascinante da vida da escritora mato-grossense, alimentam proverbial evidência no meio literário: a verdadeira dimensão do escritor não reside somente em sua obra, em sua habilidade em subtrair as emoções do fundo das almas, mas também na presença cósmica, na vitalidade da trajetória e no exercício cotidiano.

Escritora em tom maior, romancista, contista… Assim começa, no Dicionário Crítico de Escritoras Brasileiras de Nelly Novaes Coelho, o verbete de Tereza Albues com mais de três substanciosas páginas. Com efeito, são poucos todos os espaços quando se trata de falar sobre a autora e sua obra.

De muitos méritos se abastece esta coletânea de contos de Tereza. Expressividade, leveza e refinamento da língua estão patentes na tradução do drama coletivo. Com habilidade, faz saltar de dentro de sua inflamada cosmovisão uma série de personagens desenhados ao sabor de um fluxo lírico, ora calmo, ora impetuoso. As tramas, distintas entre si, revelam diversos comportamentos frente a experiências comuns ou inusitadas. O mundo real abre passagem para o mundo mágico e vice-versa, através de um mecanismo próprio e indecifrável para o qual estabelecemos indagações. Na base da escrita está o sonho? A realidade? Ou os dois perigosamente próximos?

Ao longo de Buquê de Línguas, notamos uma funda ressonância nômade. A inquieta escritora não obtém suas imagens apenas de lugares estranhos, fictícios, mas também de outros lugares de sua experiência errante concreta. A propósito, é o que expressou numa dada entrevista: “O autor sofre a influência da realidade que o cerca, assim como se identifica com o que vai experimentando e assimilando (ou rejeitando) no dia-a-dia”.

O próprio conto a dar título ao livro é uma metáfora convincente da multiplicidade. Nele, o ponto de partida é o medo sentido frente ao perigo ou possibilidade de morte. A narrativa de uma explosão na linha D do metrô em New York revela as diferentes reações dos passageiros, de várias origens, num momento de tensão. É a iminência da morte comandando o espetáculo da vida. Um espetáculo que não passa despercebido na supervisão de Tereza em relação ao mundo, seja selecionando instantâneos na tropical Cidade Maravilhosa, seja captando as seqüências da rebelião de uma flor no frio novaiorquino.

Tereza Albues extrai sentido das camadas mais profundas, atingindo extensões incalculáveis no campo do possível e no campo do etéreo. E é para esses dois universos que estende o braço e apanha mais uma flor para seu buquê. Sim, através de O enigma de Violeta H, a escritora se mostra também artífice na terra alucinada da poesia, quando narra, de modo exuberante e enigmático, o gosto indomável da natureza na variação de suas formas, sem indagar se é, para o escolhido, uma alegria ou um tormento.

Em outro instante, voando na lembrança da infância, a escritora nos remete para o interior de um colégio de freiras e para as cenas de um universo de defeitos e virtudes, inocência e deslizes, próprios de toda aldeia do mundo. E não apenas nesse conto, O Furo do mamão, é entrevisto o senso crítico de Tereza ao tocar o centro da sociedade. Sua excursão é abrangente. Tem caráter de guerra e paz.

E nessa travessia uma outra característica se apresenta: a vivacidade. Uma vivacidade acentuada com sua vida que se desenvolveu desde a infância frente ao vertiginoso espetáculo de uma ingente natureza. Tereza, do universo primitivo do Pantanal, transladou-se para outras esferas, cenários de escultóricos edifícios. Ardeu na fusão de muitas culturas e se consolidou numa escrita a um só tempo de potência mística e realista.

Buquê de Línguas traz as profundas reverberações que as coisas do mundo provocam nos espíritos e mostra como o espírito se utiliza da realidade para florescer em fantasia. As criaturas de Tereza, em boa medida, concentram os problemas do meio histórico-social contemporâneo. São criaturas que tentam resolver suas tensões e seus conflitos diários, criaturas que vivem sua loucura, sua impotência, sua inquietude e solidão.

Tereza Albues extrai da multividência diferentes possibilidades, ora unindo concretude e sonho, ora separando as duas dimensões, como uma necessidade de desenvolver e seguir suas rotas de vida, de sonho e de criação.

Cada partícula de emoção e cada palavra escrita se entrelaçam e emergem corporificadas em cargas de alta voltagem. O resultado? Uma prosa vital, espontânea e intensa.

Num dos últimos contos do livro, O rapto de Cora Mara, a personagem é surpreendida, enquanto ser comum, por uma repentina percepção extra-sensorial. Fato perturbador que a faz devassar e captar o pensamento das pessoas em diversas circunstâncias. Nessa história, a fantasia põe-se a serviço da realidade reforçando que em Tereza o ato criador se vale tanto daquilo que se efetua pelo sensório, quanto daquilo que transcende os sentidos. Ao tecer suas imagens, expõe o fundo mágico de seu destino em meio à abundância da matéria cósmica.

Buquê de Línguas atesta a sensibilidade da autora. É como se diante da existência houvesse um excedente de emoções, um big bang, frente a um determinado objeto, onde a escrita se constitui como saída para um impasse de acumulação interna progressiva e desmedida.

Tereza Albues morreu em 2005, em New York, mas sua palavra apaixonada continuará provocando o ardor daqueles que a conheceram e também daqueles que por certo virão a conhecê-la.

Carlini e Caniato Editorial

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(Da Assessoria)

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